sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Rafael

Já em casa, o rapaz repousava tranquilamente em sua cama. Havia sofrido um acidente com sua motocicleta e, após ter sido levado ao hospital, foi atendido e liberado poucas horas depois. Nada grave, segundo o médico, apenas uma pequena fratura na tíbia. O motociclista, ao atravessar um cruzamento, foi atropelado por um motorista imprudente.

Confortavelmente apoiada em alguns travesseiros, estava a perna direita, imobilizada pelo gesso.

- Nossa! – Espantou-se o pequeno, ao ver a perna do tio envolta naquela casca branca e dura. – Tá doendo muito, tio?

- Não, não. Agora estou bem.

As palavras do tio não pareceram muito sinceras para ele. Sempre que ralava um joelho ou um cotovelo nas suas brincadeiras, a dor era insuportável. Como ele podia não estar sentindo dor com aquela coisa na perna?

- Mas nem um pouquinho? – Insistiu o garoto.

- Ah, um pouquinho, só. Mas já tomei meus remédios e logo, logo não estarei sentindo mais nada.

- Ah! – Disse ele, mostrando-se satisfeito com a resposta mais honesta.

Após um momento de silêncio, o pequeno desviou o olhar do gesso e, timidamente, perguntou. – E depois, tio? Você vai ficar bem? Vai poder andar de moto de novo? – Ele parecia realmente preocupado.

- Claro, claro! – Respondeu o tio, rindo e falando ao mesmo tempo, comovido com a sensibilidade do sobrinho. – O doutor disse que não foi nada demais. O carro que bateu em mim, apesar de ter avançado o sinal, vinha devagarzinho, por isso não me machuquei muito. Mas se o carro estivesse mais rápido... – O tio fez uma cara de assombro. O pequeno, também.

- Que sorte, hein, tio?

- Pois é... Mas, graças a Deus, estou bem. Só quebrei a perna.

O garoto fitou o tio diretamente nos olhos, pensativo, e perguntou. – Graças a Deus?

- Sim, sim! Graças a Deus! Poderia ter sido bem pior!

O pequeno baixou a cabeça, pensativo. Após a breve reflexão, voltou-se para o tio. – Mas o que você fez de errado?

- Como assim? – Perguntou o tio, igualmente intrigado e divertido com a indagação.

- O pastor da nossa igreja disse que Deus só faz acontecer coisas ruins com quem faz coisas erradas... Mas quem fez coisa errada foi o homem do carro, né? Ele também se machucou?

- Hã... Não... Mas é que... – Ele ia explicar que acidentes acontecem, independente da vontade de Deus, mas foi cortado pelo protesto do sobrinho.

- Não!? Mas tio! Como é que...

- Ok, ok! Já chega, meu filho! Seu tio precisa descansar! – O pai, que até então apenas observava a conversa, decidiu que era hora de intervir.

- Mas pai...

- Não, não... Amanhã voltamos aqui, certo? Despeça-se do seu tio e vamos embora. – O pequeno deu um beijo no rosto do tio e saiu do quarto, de mão dada com o pai, tentando acompanhar os passos rápidos do homem.

Enquanto desciam a escada que dava acesso à sala, o pai deteve-se por um momento. Agachou-se, repousou as mãos sobre os ombros do pequeno e, pacientemente, explicou ao filho, fitando-o direta e profundamente nos olhos. – Deus sempre sabe o que faz, filho. Por mais que as coisas pareçam não fazer sentido, às vezes, ele sempre sabe o que faz. Sempre. – O pai terminou o seu breve discurso com um sorriso, tentando inspirar confiança no filho.

- Tá... – O pequeno aceitou a explicação, embora tenha feito isso apenas para não desagradar o pai. Aquele sorriso sempre funcionava e, como o pai esperava, funcionou mais uma vez.

- Pai...

- Hum?

- Eu não duvido de Deus...

- Que bom, filho! É isso, mesmo!

Um momento de silêncio e reflexão.

- Mas às vezes ele também se atrapalha... Né?

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