segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

...

- Por que você está sempre sorrindo?

- Porque não quero parecer triste...

- Mas você não parece triste. Você é triste. Para que disfarçar, então?

- Bem, porque... Acho que é mais fácil alimentar as pessoas com sorrisos, que contar-lhes a verdade...

sábado, 28 de janeiro de 2012

...

- Naquele momento, eu só queria me atirar em um canto qualquer, sabe? Quanto menor, melhor! E chorar... Chorar, chorar, chorar, e então, dormir... Eu esperava que as coisas ficassem mais leves quando eu acordasse...

- Entendo...

...

- Por que você está chorando?

- Porque hoje eu não quero engolir minhas lágrimas...

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

...



- Qual trem você vai pegar?

Ele olhou para o próprio pulso. Não havia relógio, apenas uma mancha clara e estreita, contrastando com a pele escurecida, há muito fustigada pelo sol.

- O primeiro que partir...


- Mas você sabe a que horas ele sai?

Assim como o relógio, ele também não tinha mais o tempo.

Ele dizia que já não precisava.

- Não...

- E vai para onde?

- Não sei...

Nem tempo.

Nem certeza. De nada, na verdade.

Não tinha mais nada.

Não precisava de nada, dizia ele.

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Cedo

Ainda não

É muito cedo para esquecer

Não deixe que os sorrisos
E os novos amigos
Recém chegados, diga-se de passagem
Apaguem o passado

Não deixe

Que as vergonhas caiam no esquecimento
Que as dores, até então, eternas
Tornem-se nulas
Vazias
Simples lamentos

Não deixe, por favor

Que o amargo vire doce
E que as lágrimas
Desperdiçadas
Sequem sem sentido

Não

Você não tem esse direito

E, por favor
Nunca esqueça

Bons momentos
Tal como o vento
Sopram
E vão embora
Levando consigo a calma
E a boa sensação
Ilusória
De redenção


Os pecados
Os crimes
Esses ficam, como poeira
Como areia
Que jogada aos olhos
Arde
E faz chorar

Nada mais que a verdade

Nada que você não conheça

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Respostas

- Afinal, qual é o sentido da vida?

- Bom... Acho que não há um sentido, na verdade... Ou melhor, até há, mas... Essa é difícil de responder, hein? Não tem uma mais fácil?

- Ah, claro... - Ele riu. - Tenho, sim. Qual é o segredo da felicidade?

- Ah, agora sim! Essa não é das mais fáceis, também, eu admito, mas é melhor que a outra... Enfim...

- Hum... Sei... Tá, qual é o segredo da felicidade? - Estava começando a desconfiar que ele não tinha a resposta para todas as perguntas, como todos diziam.

- Você quer uma resposta simples ou complexa?

- Ah, por favor... Tanto faz... Qual é a diferença?

- Bem, há pessoas simples e pessoas complexas... Há quem se contente com a superfície, com a pele, com a casca, enquanto outros não se dão por satisfeitos até encontrarem o núcleo, a alma, o caroço, e...

- Olha. - Ele interrompeu bruscamente. - Se você sabe tudo, mesmo, então deve saber que tipo de pessoa eu sou, certo? Façamos assim. Responda de modo que eu entenda.

Ele fixou o olhar por alguns instantes naquela criatura sagaz e curiosa. O observado, por sua vez, devolveu o olhar, mas o seu estava carregado de escárnio. As sobrancelhas arqueadas, o sorriso no canto da boca. A escultura perfeita da superioridade vazia. Aquela construída não no próprio conhecimento, mas sim, na ignorância alheia.

- Certo... Bom, o segredo da felicidade é viver a vida sem se dar conta do que ela é...

As sobrancelhas caíram. O sorriso torto se desfez. O velho o havia colocado no bolso com aquela resposta curta, simples e, aparentemente, tola. Quase desconexa.

Mas o impacto maior, mesmo, veio quando ele se deu conta de que aquela resposta, tão banal, tão piegas, por assim dizer, respondia muito mais do que aquele último questionamento. Aquela resposta preenchia a sua primeira pergunta, que, até então, havia ficado sem resposta.

Aquela resposta, na verdade, preenchia todos os questionamentos que ele já havia feito até hoje, ao longo de toda a sua vida.

E isso o aterrorizou.

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Sereno

De vez em quando
Sem aviso, sem anúncio
Uma tranquilidade me invade

E é, assim, tão específica
Que consigo identificar
Dentre tantas outras
Tão comuns
E pobres de sentido

Misto
De acalento e apatia

Braços delicados
Cujo abraço envolvente
Deixa no ar aquele perfume
Aquele cheiro morno e gostoso
De falsas lembranças
Que atiça a esperança
Iludindo-a
Com a promessa de dias melhores

É uma tristeza confortável

Afago dolorido

Mão bruta
A alma presa pela garganta
Arremessada, com toda a força, para dentro de um corpo cansado

E lá no fundo, uma voz feia e arrastada
Arranhada
Desconfortável
E cheia de escárnio
Diz que é hora de voltar

Um beijo frio
Despedida amena
Tal como a chegada

E não posso deixar de me surpreender

O pouco tempo à penumbra
É mais que o suficiente
Para me fazer esquecer
De como a luz machuca

E eu volto
E tudo segue

Lá se vai minha serenidade.