- Boa tarde, Seu Antônio.
- Boa tarde, boa tarde. Tesoura e máquina ou só máquina? - Perguntou o
barbeiro.
- Só máquina, por favor. Aquele corte de sempre. - Respondeu, enquanto se
ajeitava na cadeira.
Com o zelo que lhe era peculiar, o barbeiro abotoou cuidadosamente a capa
branca em torno do pescoço do rapaz. Em seguida, com um pouco de talco em uma
das mãos, delineou o corte a ser feito, passando o pó branco na nuca e um pouco
abaixo das costeletas.
Seu Antônio. Setenta e oito anos de idade e sessenta e dois de profissão. As
mãos trêmulas, características dos anos vividos, tornavam-se firmes e ágeis ao
segurarem as ferramentas de trabalho.
- E o tratamento, Seu Antônio, como está indo?
- Está indo, está indo... - Disse o barbeiro, rindo sem muita vontade. - Agora faço
a tal da hemodiálise todos os dias... Eu até me sinto melhor, mas os meus
braços... Bah... - Ele parou de cortar por um instante e levantou os braços,
mostrando-os pelo reflexo do espelho. Havia uma grossa compressa de gaze e
esparadrapo em cada um dos antebraços. O jovem sorriu, compadecendo-se com a
situação do velho, que já havia voltado ao trabalho e nem percebeu o suspiro
pesado do rapaz. Era incrível como, apesar das dificuldades, o barbeiro
trabalhava todos os dias, das sete da manhã às sete da noite, sem perder o bom
humor ou a paciência com os clientes, com as suas dores e com a própria vida.
O zumbido da máquina preencheu completamente o silêncio que se fez após aquele
último e curto diálogo. Logo, como sempre acontecia, o rapaz fechou os olhos e,
sentindo aquele torpor agradável que conhecia tão bem, relaxou o corpo na
cadeira e abriu-se aos pensamentos que lhe vinham à mente.
É verdade que, independente da idade, a vida pode ser interrompida a qualquer
momento e por qualquer motivo, mas, na velhice, viver se assemelha muito a
estar em uma fila de espera, como quando se está no dentista, por exemplo,
esperando para ser atendido. Há um outro paciente na sala, você não sabe o
quanto ainda vai demorar, você sabe que pode ser chamado a qualquer momento,
mas não sabe exatamente quando, então você pega uma revista para ler e matar o
tempo enquanto sua hora não chega. De vez em quando, mesmo entretido com a
leitura, você ouve o som incômodo da broca e se pega pensando quando será a sua
vez, mas logo esquece e volta a ler, e de repente, quando você está absorto em
algum texto que conseguiu capturar sua atenção na bendita revista, a porta se
abre e o doutor aparece, sorrindo cordialmente e dizendo. - É a sua vez. Venha,
por favor.
Quando se dirige aos últimos anos, a vida parece se resumir a deitar a cada
noite e, dependendo do seu tipo de fé - ou da ausência de uma -, não saber se o
que virá a seguir será um sonho, a manhã do próximo dia ou o fim definitivo da
existência.
Era, ao mesmo tempo, estranho e triste saber que aquele corte de cabelo de
quinze minutos poderia ser todo o tempo que ambos ainda tinham. Um quarto de
hora e um corte de cabelo eram mais que suficientes para acabar com a
convivência de dois amigos de maneira irreversível. Seu peito ficou pequeno ao
pensar que poderia voltar no próximo mês e encontrar a barbearia fechada, sem
aviso algum na porta, sendo possível apenas deduzir, compreender e aceitar que
o que já era de se esperar, enfim, aconteceu.
- Pronto! - Disse o barbeiro, com a voz calma e, mesmo depois de incontáveis
cortes, orgulhosa por mais um serviço bem feito. O senhor deu algumas espanadas
no pescoço do rapaz e, ao começar a desabotoar a capa, percebeu seus olhos
vermelhos. - Tudo bem com você, meu amigo? - Perguntou o barbeiro, visivelmente
preocupado com a possibilidade de ter, sem querer, derrubado talco ou alguns
pedacinhos de cabelo cortado nos olhos dele.
- Sim, sim... Tudo bem... - Disse o mais novo, rindo e esfregando os olhos,
despertando de seu transe costumeiro. - Acho que esqueci de piscar... - E riu
forte, dissipando de uma vez por todas aquela estranha e pesada nuvem de
desconforto que os envolveu por um momento.
Espreguiçou-se para afastar a conhecida sensação de sonolência que sempre o
abraçava quando cortava o cabelo, embalada por aquela gostosa - e não menos
estranha - espécie de coceira que sentia dentro da nuca ao ouvir o som repicado
da tesoura, aparando o corte grosseiro da máquina com seu estalo metálico, curto
e ritmado. Por fim, desceu da cadeira e deu uma última olhada no espelho, vendo
seu rosto emoldurado pelas fotos antigas coladas na moldura de madeira,
adornando seu reflexo confuso. Na fotos, a esposa, já falecida, e os filhos,
roubados pelo mundo, pareciam dividir de seu súbito sentimento de melancolia.
Respirou fundo e piscou com força, tentando secar os olhos e não mareja-los
outra vez. Pegou o dinheiro em seu bolso e o entregou ao barbeiro, apertando
sua mão em seguida e dando-lhe um tapinha carinhoso no ombro.
- Obrigado, Seu Antônio... Até logo mais... - Sua voz pareceu fraquejar na
última frase.
- Até mais, até mais! - O barbeiro já estava varrendo ao redor da cadeira,
recolhendo os restos de cabelo recém cortados.
Ele saiu rápido. Só queria chegar logo em casa e abraçar a noiva. Falar de modo
apaixonado e piegas sobre o filho - ou os filhos - que ainda teriam, sobre as
viagens que fariam e sobre todas as boas lembranças que ainda viriam a lhes
pertencer. Ele estava realmente impressionado com aquela ânsia repentina de
fazer, de viver e, principalmente, de não morrer. Queria, mais que tudo, viver
o que fosse possível antes de sua vida, de modo certo e inevitável, tornar-se o
pavio de uma vela curta e bastante gasta, queimando vorazmente seu último
pedaço de cera.
Não conseguiu evitar que seus olhos se enchessem de lágrimas novamente. Ele
estava tão, mas tão conturbado, que nem sequer percebeu o carro que, em uma
fração de segundos, tentou frear e acabou jogando seu corpo sem vida contra a
calçada em frente à barbearia.
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